FORROBODÓ NO BOLICHO
Segundo os dicionários da língua portuguesa, forrobodó é
baile popular, baile caseiro, arrasta-pé, forró, farra, festança, bochincho,
baileco, baile chinfrim.
O mais provável é que forró, baile popular em que casais
dançam ao som de ritmos nordestinos seja simplesmente a forma reduzida de
forrobodó, termo existente no português desde o século XIX e de significado
igualmente festivo, embora não restrito unicamente ao Nordeste do Brasil.
Tirei lá do fundo do baú um caderno de poemas copiados por
mim há mais de 50 anos, de um velho almanaque, onde encontrei o poema de Lauro
Pulga, Forrobodó no Bolicho. Esse poema
escutei pela primeira vez sendo declamado em uma emissora de rádio da cidade de
Jaguari, RS. Do autor, Lauro Pulga, nada encontrei até hoje. Acredito que esse
nome seja um pseudônimo.
FORROBODÓ NO BOLICHO
Poema de Lauro Pulga
Buenas tardes, companheiros,
Peço um naco de atenção...
Vão puxando das cadeiras
E se assentando pelo chão.
Vou contar-lhes nessa trova,
uma linda narração...
Numa tarde de domingo,
Lá pras bandas do Cerrito,
Chega um cabra no bolicho,
Resmungando pro Chiquito:
- Vamo vê, seu bolicheiro,
Passe logo um bom traguito!
E o seu Chico, arrenegado,
Foi falando pro negrote:
-Meu rapaz, não enche os tubos
Que eu destampo o teu cangote,
Largo o relho no teu lombo
E tu vai sair a trote...
Foi então que um bando feio
Veio entrando porta afora:
Eram cabras quixotescos,
Eram tipos lambisporas:
Calças largas, lenços velhos,
De chinelos com esporas...
Dez focinhos de moleque
Que faz beiço mas não chora...
Vão entrando barulhentos,
Se encostando no balcão,
Reclamando vinte tragos,
Ou melhor, um garrafão,
Porque os tipos quando bebem,
Sobra só copo na mão !
Vem um trago e vai um trago,
Desce pinga até a botina
E um sujeito, cola chata,
Já gritou com cara fina:
- Pois nóis semo que nem forde
Que não vai sem gazulina !!!
O Maneco das tranqueiras
Se torcia no violão
E o Joaquim dava compasso
Com o cabo do facão,
Mas o Juca Viralata
Namorava o garrafão...
Era aquele vira e mexe
Na salinha do bolicho:
O pessoal saracoteava
Que nem rato na macega
E o valente Bocatorta
Deu o tom dessa refrega:
- Tome nota, pichotada,
Que quem manda aqui é o dega
E você, seu violoneiro,
Vai largando mais um péga...
- Mas não mesmo, seus malandros,
Não me venham com bobagem !
Reclamou o bolicheiro,
Demonstrando sua linhagem...
- Não permito bagunceira,
Nem sequer por homenagem
E si alguém quer criar caso,
Pois que vá seguindo viagem !!!
Barbicacho ! É a tal da coisa:
Quem mais bate mais entorta,
Pois, erguendo o seu “formiga”,
Berrou logo o Bocatorta:
- Cala a boca, bolicheiro,
Seu nariz de vaca morta
Que te tiro o couro a talho
E o penduro nesta porta !!!
E o Chiquito dava pinga,
Sem largar outra ameaça...
Só, de vez, dizia baixo:
- Vai pro diabo, triste raça,
Que, prá mim, nessas barrigas,
Há enchente de cachaça...
Mas a turma nem ligava
E seguia na festança...
Neste ponto o Bocatorta
Pega prato na balança,
Bate cinco ou sete vezes,
Dando ordem sem tardança:
- Tá na hora, minha gente,
Vamo entrá logo na dança !
Ninguém mais ficou parado
E era aquele bate espora...
As barricas que estorvavam
Foram postas lá prá fora
E os erguidos pela pinga,
Só dançavam com escora...
E a cachaça ia subindo
Ao sabor da bebedeira...
Vai agora o Bocatorta
E comanda da cadeira:
- Tocadores pro balcão
E o Joaquim prá prateleira
Prá que todos encherguemos
O compasso da rancheira !
O Joaquim ficou danado,
Fez nariz de lobo mau,
Mas foi logo obedecendo
Que sinão corria pau...
Se encravou na prateleira
Que nem velho pica-pau !!!
De repente se despenca
Cai por riba do balcão,
Esparrama os tocadores,
Faz em cacos o violão...
Dessa vez nem Bocatorta
Põe em paz a situação...
A bagunça já começa,
A cachaça faz o efeito:
- Porque este, porque aquele,
Porque aquilo não é jeito...
E o facão vai descambando
No nariz de algum sujeito...
Bocatorta grita e manda,
Ninguém ouve suas asneiras
E os facões abrem picadas,
Voam latas e madeiras...
Vinte cortes vacinaram
O Maneco das Tranqueiras
E o Joaquim já está tapando
Oito rombos nas cadeiras !!!
O valente Bocatorta
Virou quase lobisome:
- Macacada – berrou ele –
Vô mostrá que o dega é home !
Já atorei dezoito orêia
Desses cabra sem renome...
Joguei nacos de costela
Prum cuscão louco de fome !
Si não racho vocês tudo
Que me mudem já de nome!!!
Mas no forte do entrevero,
Quando a coisa estava feia,
Entra um grupo de polícias,
Dando cabo da peleia...
Prende o bando de borrachos,
Passa todos na correia...
E o polícia comandante
Lhes gritou de cara cheia:
- Seus malandros, beberrões,
Não se abusa em casa alheia...
Nesses bailes furdunceiros
Tudo acaba é na cadeia !!!
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